Idade não é deficiência (algumas ideias sobre o envelhecer e a arquitetura)

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Uma conversa com o amigo e colega Oscar Muller sobre o afazer arquitetônico e o processo do envelhecimento humano, levou a algumas reflexões de como pensar e/ou adaptar espaços para os seres humanos que tem o privilégio de viver mais algumas dezenas de anos. Começando pela frase que dá título à postagem: 

Idade não é deficiência. 

Com certeza a ideia dos velhinhos de bengala que povoavam os símbolos dos 60+ estão sendo repensados porque muitos de nós estamos em plena (ou quase plena) forma física e mental.

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Pode gerar uma “desabilidade”, mas não obrigatoriamente. As necessidades do idoso são confundidas com as de pessoas com deficiência, como se não existissem idosos plenamente funcionais! Existem, e a primeira preocupação deveria ser preservar esta condição, e para tanto, a preservação pelo uso é a melhor ferramenta.

Existem cuidados óbvios, e outros nem tanto.

Ao mesmo tempo que se dá muita atenção em evitar quedas, não há nenhuma em relação à preservação da mobilidade. Segurança, conforto, salubridade, são importantes, não podem ser desconsiderados, mas estímulos também o são em igual medida.

Estímulos são super importantes para manter as pessoas vivas e atentas. Muitas vezes os mais jovens, no ímpeto da mudança, impõem suas verdades e vontades aos mais velhos, sem atentar para as suas necessidades imateriais. 

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É preciso atentar para a eficácia de alguns procedimentos, práticas, e pressupostos. Conforto é tão relacionado com a inatividade, quanto o esforço se relaciona com o exercício.

Escadas

Convém ao idoso o ambiente plano, mas enquanto este não desenvolver uma deficiência que o obrigue ao uso de uma cadeira de rodas, o melhor é que continue se locomovendo diariamente de forma autônoma, de forma que possa acessar e utilizar não só os cômodos de sua residência, mas também espaços públicos, com naturalidade, como qualquer outra pessoa, independentemente de sua idade.

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Uma escada deve, sempre, ter seus degraus e pisadas com altura constante, corrimãos em alturas adequadas, patamares onde necessários, etc, como mandam as normas, e isto não objetiva apenas atender à terceira idade. Se um idoso vive em uma morada que não é térrea, e se utiliza de uma escada quotidianamente, preservará assim esta habilidade, e se manterá apto a transitar por outros espaços (que não sua residência) quando assim desejar.

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Sem esquecer que corrimãos e fitas adesivas que garantam a visibilidade de degraus é indispensável para evitar acidentes. Outras providências são iluminação adequada e, se houver necessidade, o uso de aparelhos adaptadores para subida e descida. Um espaço para sentar no patamar também é uma excelente ajuda.

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Em tempo, escadas podem ser projetadas sob medida. A lógica do desenho considera que o esforço para subir, é o dobro do para avançar, assim, somando duas vezes a altura do degrau, com sua largura, tem-se um passo, e sua medida varia de pessoa para pessoa.

Aqui Oscar fala de sua experiência pessoal em sua casa.


A casa e a academia

Dou-me como um exemplo. Tenho 1,70m, e sou brevelíneo, a escada mais confortável, portanto, ficou com 18cm x 30cm. Habito há duas décadas um pequeno sobrado, construído com porão de excelente pé-direito, e uma cobertura em duas águas com boa inclinação, detalhes que permitiram, com uma reforma, o aproveitamento da edificação em quatro andares. Na verdade até mais, pois também criamos um solário na cobertura, e fizemos uma pequena adega, usando o espaço resultante das escavações para um reforço estrutural das fundações.

Desenvolvi a reforma cônscio de minhas deficiências adquiridas. Condições genéticas, e uma juventude sem temor, me brindaram com uma coleção de hérnias e parafusos, já bem grandes na meia idade, exigindo atenção para a coluna vertebral, o que motivou algumas providências, incluso aí o desenho específico das escadas, uma parede de escalada, manivelas…

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Um detalhe: escalada é atividade muito completa, excelente para todas as idades, para todo o corpo, e também para a mente. Aqui a parede de escalada foi feita com uma roldana, de sorte que é possível o uso de contrapesos nos cabos de segurança, para que o usuário possa se exercitar com metade, ou um terço do seu peso, diminuindo, ou aumentando esta diferença conforme o hábito e suas necessidades específicas.

Habitando uma residência assim, todos transitam usando uma escada projetada especificamente, mas ainda assim dentro dos limites estabelecidos pelas normas vigentes. Calculo que se eu me matriculasse numa academia, e fizesse 3 seções por semana de meia hora cada, em uma daquelas máquinas de step, provavelmente dispenderia o mesmo esforço, mas se em uma alternativa tenho que ir e voltar da academia, ter este tempo comprometido, pagar mensalidades, etc., em casa não me custa nada, nem percebo que estou me exercitando, e não tenho a menor consciência do tempo gasto na atividade.

Tempo

Um idoso sabe, quanto mais idade, mais precioso se torna o tempo, e sobre isso há mais o que considerar. Todo idoso já viveu, teve sua experiência de vida particular, com afazeres, hábitos, vícios, e condições também particulares e específicas, tornando suas dificuldades (e habilidades) também específicas, o que potencializa o bom resultado de um projeto que cuide destes detalhes também especificamente, o que deve ser feito com a colaboração de um fisioterapeuta, à exemplo do que faz o personal trainer, quando define a rotina que a pessoa deve seguir na academia.

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Genericamente


Pode-se pensar em medidas mais genéricas, como promover o subir e descer, o sentar e levantar, que são benéficos (e não só para os membros inferiores) em qualquer idade, mas são muito mais importantes para a terceira, entretanto não há como escapar da atenção acerca de necessidades resultantes de deficiências já adquiridas.

Para os membros superiores, o ambiente pode promover movimento, alongamento, também muito importantes, o que se pode obter com prateleiras em alturas estratégicas, manivelas para acionar toldos, varais, etc., e deve-se ter o cuidado de posicioná-las, de sorte que o usuário precise usar o braço direito em uma, o esquerdo em outra… Um simples gancho na altura correta, para pendurar a toalha, promove aquele alongamento quotidianamente, sem que o usuário se dê conta.

E aí temos a engenhosidade de projetos pensados para as pessoas em todos os seus aspectos. 

Corpo e Mente

Mas não é só sobre o corpo que podemos incidir. O espaço também cria estímulos mentais, essenciais para a terceira idade, e pode-se fazer uso disto. Idealmente também com a colaboração de um psicoterapeuta (vide Espaço & Estímulo), e nesta seara, há muitas providências genéricas que podemos adotar.

Hortas, gazebos, solários, varandas, terraços, enfim, convites para estar ao ar livre, competem contra a tendência de se submeter à reclusão e ao sedentarismo, oferecida pelos espaços perfeitamente adaptados à usual noção de conforto do público em geral.

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Mesmo nos limites da residência particular, nos espaços semi-públicos, junto da rua, nas fachadas, recuos, alpendres, um local para estar confortavelmente, e sentar um convidado, promove relações com passantes e vizinhança, ampliando o modelo de mundo do idoso, combatendo assim a tendência contrária, que é natural, pois o idoso reduz suas atividades sociais ao longo da vida, com o afastamento da família, a aposentadoria, etc…

E como bem lembrou o colega Oscar, é salutar planejar as aberturas para a melhor paisagem e levando em consideração o ponto de vista do usuário, no caso do idoso, altura da cabeça na cama ou sentado em uma poltrona.

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Pensar as casas para todas as idades é necessário em uma sociedade onde os avanços da medicina e hábitos saudáveis de vida fazem com quem camadas da população possam viver mais e melhor. 
  • Pensar em banheiros com barras e pisos antiderrapantes para prevenir quedas. 
  • Uma boa iluminação, com luminárias com sensor de movimento, especialmente no caminho do banheiro.
  • Não deixar os ambientes com uma só cor, mas ao contrário, promover uma diversidade para que os ambientes e móveis possam ser percebidos com facilidade por quem tem problemas de visão.
  • Circulações e portas mais largas para facilitar a locomoção, caso sejam necessários cuidadores ou cadeiras de rodas.
  • Ter cuidados com tapetes e peças soltas ou com quinas que possam ocasionar quedas, ou machucados.
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São pequenos cuidados que podem auxiliar que os usuários, sejam jovens ou mais velhos, possam habitar uma morada com conforto e segurança. E mais uma vez ressaltando que os idosos, uma parcela considerável da população que hoje abrange pessoas de 60 a mais de 100 anos, tem uma probabilidade de viver dezenas de anos com autonomia e felicidade. Lembrando que a meta é envelhecer, permanecendo jovem a maior parte possível do tempo. 

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Comentários

  1. Bom dia Elena, hoje foi a primeira vez que li um artigo seu e gostei muito. Obrigada por estar ha 20 anos nos informando e atualizando.

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